Um Eléctrico Chamado Desejo (Crítica)


“Um Eléctrico Chamado Desejo” é inegavelmente uma das grandes peças do século XX. Foi escrita em 1947 e espelha todo o génio do seu autor, Tennessee Williams, também ele justamente considerado um nome maior do teatro. Assim, como não podia deixar de ser, o anúncio da sua integração nesta temporada do Dona Maria (TNDM) foi recebido com grande satisfação. Restava saber se a encenação de Diogo Infante, actual director artístico do teatro, seria capaz de sobreviver às expectativas que cada reposição desta peça gera. Em suma, se seria capaz de passar um teste tão duro. Quanto a mim, consegue-o. Não saímos dali a pensar que vimos algo inesquecível, mas damos por bem empregues as duas horas e meia que dura a peça. Não passa com distinção, mas leva boa nota.

Vamos por partes.

A encenação opta por um cenário giratório que acaba por se revelar uma boa solução, dado o constante saltitar entre espaços. No entanto, sente-se que falta aqui e ali alguma dinâmica, há uma ou outra quebra de ritmos. Apesar disso, Diogo Infante consegue uma encenação eficaz, colorida pelo excelente trabalho de cenografia e figurinos (que isto representar é muito bonito mas é importante não esquecer o trabalho “invisível” que também existe). Quantos aos actores, a prestação é no geral bastante boa. Além disso, temos o bónus de ver algumas caras conhecidas a mostrar que merecem mais do que as novelas da TVI. É de destacar, em especial, a prestação de Lúcia Moniz, que constrói uma Stella DuBois sensível e ternurenta na dose certa, sem nunca cair na lamechice. Surpreendeu-me. Albano Jerónimo também se sai bem, em especial nas tiradas secas com que Stanley provoca Blanche, mas já não cabe na categoria “surpresa”. Por fim, o tão esperado regresso de Alexandra Lencastre. Devo confessar que demorei um bocadinho a habituar-me ao tom de voz da personagem, e que por vezes se notaram os anos passados na televisão. Apesar disso, não desiludiu, o que não é pouco tendo em conta a dificuldade que é representar, ou antes , “ser” Blanche DuBois.

Para o final, e como é de bom tom, guarda-se o melhor. E o melhor, aqui, é o texto. Tennessee Williams escreveu uma peça com um ritmo alucinante e personagens que impressionam pela sua profundidade. Nela começa gradualmente a formar-se uma espiral de tensão e violência que culmina num drama em que ninguém ganha e todos perdem. A vida é uma merda, que não haja ilusões sobre isso. Apesar de tudo, e como Blanche diz a certa altura, “Deus às vezes existe… tão depressa!”.

Se dúvidas houvesse, "Um Eléctrico Chamado Desejo" é a prova.

Fonte:Arte-Factos

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